Liderança humanizada na publicidade com Enzo Sunahara
Papo Possível, Edição 5, Temporada 1 | 2024
O Papo Possível esteve comigo em 4 países desde seu início. Entre projetos e viagens, muitas coisas aconteceram na minha vida que inevitavelmente transformaram a forma como enxergo de forma mais positiva o meu próprio futuro. A reflexão é que ando pensando em como poderia trazer conteúdos mais pessoais que servissem o propósito do projeto. Se você quiser compartilhar sua opinião sobre a ideia, te agradeço enormemente. Só deixá-las nos comentário que tomarei meu tempo para ler todas. Muito obrigado!
Enzo Sunahara, diretor de criação com liderança humanizada
No Papo Possível de hoje, trago uma conversa inspiradora com Enzo Sunahara, um publicitário nato que carrega uma rica mistura de criatividade e liderança humanizada na publicidade. Enzo compartilha sua trajetória não-linear, influenciada por uma educação rígida que ele transformou em uma busca constante por autenticidade. Ele discute como suas convicções pessoais permeiam seu trabalho, a importância das relações e as mudanças que o moldaram, desde a infância até seu papel atual como Diretor de Criação. Boa leitura.
Salve, Enzo! Qual a história sobre você que gostaria de contar pra gente?
Eu sou uma dessas pessoas que não conseguem separar muito o profissional e o pessoal.
Já fui bastante “workaholic”, acho que por muita influência da educação rígida que eu tive. Porém, essa rigidez asiática era algo que eu não aceitava muito em mim. Então a criatividade foi uma maneira que encontrei para ser autêntico. Acabei indo para a publicidade por conta disso, e tenho orgulho de uma trajetória incomum e não-linear dentro da profissão.
Acabei conhecendo gente que admiro e fazendo amigos na faculdade e nas agências. Eu acho que meu papel no mundo é de alguma forma ajudar as pessoas, talvez por isso tenha seguido um caminho de liderança.
(Primeiro, como você sem o crachá?)
Eu não sei se sou uma pessoa muito diferente sem o crachá. Acabo levando as minhas convicções e o que sou para o trabalho. Mas o que as pessoas veem no dia a dia é um recorte, saca? Quem entra mais na minha vida pessoal acaba sacando que eu tenho algumas questões filosóficas bem profundas sobre a vida, amo cozinhar, viajar, ler, fotografar, jogar (tenho mil e um hobbies e faço tudo mal). Vivo com minha companheira e uma enteada adolescente e nossa rotina é bem pacata, muito embora a vida pareça super agitada pra quem olha pelas redes sociais.
(Voltando um pouco ao tempo, me conta que tipo de berço você nasceu? Seria interessante saber sobre os lugares que vive e viveu.)
Eu acho que nasci nômade, né? Ambos meus pais são descendentes de japonês, nasci no noroeste do Paraná, em Umuarama. Estudei até em colégio de freira (juro), fiz Kumon obrigado e com 8 anos e meio fui para o interior de SP. Morei mais uns 6 anos em Piedade, no interior, acredito que meu tempo lá tenha influenciado bastante na pessoa que sou hoje. Tive amizades verdadeiras, aprendi o valor da humildade e da lealdade, descobri a paixão pela música e também lá era livre pra ser o quão estranho e desajeitado um adolescente pode ser. Consegui uma bolsa para um colégio muito bom em Sorocaba e acabei me mudando pra lá. Tive uma relação bem estranha com as pessoas, seja pela diferença de condições sociais ou até comportamentais. Mesmo assim, acho que esse “perrengue” também foi essencial para a minha formação.
(Então, quais foram as suas maiores influências?)
Essa pergunta é difícil demais. Eu me considero meio deslocado da minha família, sou o filho diferentão dentro de um seio familiar muito tradicional. Ao mesmo tempo, acho que meus pais são minha primeira grande referência. Minha mãe pela maneira metódica e planejada de ver a vida, meu pai por me mostrar o lado das relações pessoais e de conversar/escutar todo mundo. Minha irmã também foi super influente: ela é médica e anda 200% na linha mas sempre teve uma rebeldia, uma atitude de não aceitar o que não concorda que eu também peguei pra mim. Como redator, tive o Chico, meu primeiro diretor de criação redator que me ensinou a escrever como redator. Na mesma época teve o Vicente, um revisor que foi bem ascendente na minha vida, me estimulando a escrever meus contos, a ler os clássicos e a sempre buscar conhecimento.
Teve o Jairo e o Silmo na VML, DCs que me ensinaram a liderar de maneira empática e humana. Tem a Amanda, minha companheira, que tem uma visão de vida super diferente de mim em muitos aspectos e eu sinto que essa diferença soma demais (espero que eu também some o mesmo para ela). Tem o André, meu dupla e sócio que conheço há 17 anos e com quem compartilho a rotina e consigo sempre aprender algo novo. Eu poderia passar o dia citando mais pessoas que são referências para mim, porque tive o privilégio de conhecer muita gente foda, mas acho que essas são as principais.
Entre tantas mudanças entre países e experimentos de vida, tem alguma que te projetou para um lugar inesperado?
Eu acho que tive alguns períodos-chave na minha trajetória. A primeira foi dar vazão à minha rebeldia de uma maneira mais velada, uma vez que eu era bolsista na escola. Descobri minha criatividade como “arma” de protesto e a usava para engajar as pessoas nos meus “protestos”.
O fato do meu pai ter tido uma trajetória empreendendo em vários campos acho que também me influenciou bastante, mas como eu sei o perrengue financeiro que pode existir no empreendedorismo, isso pra mim foi mais atitudinal como postura de carreira do que como de fato ter meu próprio negócio.







Teve um período longo que fiquei muito estável na agência Rapp, que hoje não tem mais operação no Brasil. Foi um período muito bom, mas que meio que me acomodou. Fiquei 5 anos por lá, era bem visto e valorizado internamente. Mas para quem via de fora eu não evoluí. Conforme eu ia percebendo esse processo, também me jogava em outras coisas. Mentorei gente mais nova sem saber o que era mentoria, fui banca de TCC, aprendi a poupar, juntei um valor que dava pra comprar um carro zero e pedi demissão. Passei 3 meses em Nova Iorque estudando e voltei uma pessoa muito diferente. Foram 3 meses sendo a minha principal companhia, quase metade deles duvidando da minha capacidade.
A gente sempre quer estar quentinho e protegido, mas sem conflito uma história não se desenvolve, sabe?
Se eu fosse elencar os principais momentos que influenciaram na minha trajetória, acho que são esses.
Estando na publicidade por tanto tempo e agora em cargo de liderança, como suas atividades profissionais andam em linha com sua visão?
Eu acho muito bacana a minha história com a F2F. O que me fez estar aqui, basicamente, foi uma admiração mútua que foi crescendo. O André entrou na agência quando tudo era mato e eu fui acompanhando o crescimento e pensando “tem algo de interessante acontecendo aí”. Ao mesmo tempo, ele queria reeditar nossa dupla criativa (fomos dupla de estagiários) e foi vendendo meu peixe, ao passo que eu desenvolvia uma carreira interessante. Acho que ambas as partes foram vendo que havia uma possibilidade real de dar match e acabaram se esforçando para que acontecesse. Eu lembro que já em Portugal conversei com o Fred, um dos sócios-fundadores da F2F, mas por uma situação pessoal não rolou. Ele entendeu meu momento e foi super bacana, deixando as portas abertas. Depois eu tive um tempo que pensei até em não me fixar em lugar nenhum, me chamaram pra um freela, eu fiquei por 9 meses. Saí por um ano e voltei de novo (mas continuei fazendo freelas pra cá durante o ano “fora”, então eu sinto como se nunca tivesse saído).
Olhando para o futuro, como você vê as práticas de impacto positivo evoluindo dentro de sua indústria?
Eu tenho uma oportunidade rara de participar ativamente da criação da cultura de uma agência. Hoje, como Diretor de Criação e sócio, sinto que posso ajudar a pavimentar um caminho diferente no mundo das agências. Dá pra ser criativo sem ficar virando noite e trabalhando no fim de semana. Dá pra ser bom criativo sem deixar de ser um bom companheiro, filho ou padrasto.
Eu amo o que faço, mas isso é uma parte da minha vida, não ela toda. Ironicamente, me dedicar às outras partes acaba me tornando mais completo e rico de referências.
Eu não curto aqueles papos de coach “faça o que você ama…” mas acho que dá pra amar o que a gente faz (que é bem diferente). Cada minuto que eu passo criando eu me divirto. Eu quero compartilhar esse senso com as pessoas e assim mostrar que todo mundo consegue ser, ao mesmo tempo, produtivo e sair cedo pra tomar cerveja, ir pra academia ou ao cinema. É o que tento passar como professor e mentor de carreira na RedHook também.
(Como a missão da sua empresa se alinha com seus valores?)
É engraçado porque logo de cara eu posso dizer que tô numa agência que tem uma trajetória incomum, assim como a minha. Mas a ideia de ser uma agência transparente, parceira e agir como consultora são das coisas que mais me dão match.
Tem agência que não vai apontar a melhor estratégia para não deixar de ganhar o BV (bônus de veiculação) e eu já vi isso. Ninguém é inocente, no contexto do capitalismo todo negócio busca lucro, mas fazer isso sem ser mesquinho e tomar decisões baseadas nas nossas competências pra mim é essencial. Temos um ambiente leve, respeitoso e eu vejo que toda a camada de liderança tenta aprender e melhorar a cada dia. Nessas cadeiras, normalmente, as pessoas se acomodam e apensas querem exercer o “poder”. Nós temos a plena noção de que trabalhamos para a nossa equipe.
E jogando o papo lá para 2030, que tipo de mundo você enxerga como possível?
Esse exercício de “futurismo” é interessante porque estamos num contexto de grande pessimismo: duas guerras, gente com medo de perder emprego pra inteligência artificial, polarização política. Ao mesmo tempo, eu vejo movimentos que são no mínimo interessantes. Por exemplo, vejo uma mudança no quadro das lideranças das agências. Em alguns lugares a gente sabe que as mudanças podem ser apenas “cosméticas” (tokenismo), mas isso acaba obrigando um movimento de aprendizado para as camadas de gestão. A diversidade trazida nas cadeiras de liderança traz resultados positivos, o que de certa forma vai acabar consolidando pelo menos uma parte dessas pessoas nas suas funções. A China vem forte para quebrar hegemonias de mercado e transformar muitas indústrias. Metade dos carros elétricos do mundo foram fabricados por chineses, fato que tem causado reações de gente como o Elon Musk. E, falando na AI, infelizmente ela vai reduzir os postos de emprego em mercados extremamente saturados, mas isso também aponta para o surgimento de novas profissões. A tecnologia é inevitável, os computadores e a internet eliminaram muitos mercados e criaram tantos outros. O mundo que eu enxergo para 2030? O tempo é curto, mas acredito que estamos à beira de mudanças bastante radicais, o que pode ser muito bom. Testes com jornadas de trabalho reduzidas apontam para termos mais tempo para nós. Isso com uma liderança mais diversa e empática, novos paradigmas de capitalismo e mais automatização proporcionada pela AI pode significar um “freio” necessário à maneira como temos vivido. Mais tempo para refletir, alterar nossa relação de consumo e, quem sabe, conseguir reajustar a rota do planeta.
Como você consegue se manter inspirado, Enzo?
As pessoas são a minha fonte principal de inspiração. Trabalhar com gente cheia de energia e tesão me ajuda a manter o pique. Eu sou uma pessoa que gosta bastante de ouvir e observar também. Fico sempre de olho no movimento de amigos e gente que admiro e tento refletir sobre. As minhas referências vêm dos mais diversos lugares e sempre se relacionam com quem conheço e convivo. A curiosidade é o que nos move, né? Como humanidade.
Acho que o que mais me inspira são aquelas pessoas que tiveram coragem de virar a vida 360°. Mudar de CEP, profissão, virar vegano, minimalista, nômade, empreender, encarar um desafio muito grande, trocar uma multinacional por uma empresa de pequeno porte…
Tudo isso me faz ver que tudo é possível através de uma capacidade criativa poderosa: a nossa capacidade de nos reinventar.
Por fim, que tipo de provocação você gostaria que as pessoas refletissem sobre?
Eu acho que temos uma cultura muito relacionada a “culpa” e “punição”. O medo guia as nossas decisões. Eu queria que todo mundo pensasse mais no coletivo por vontade própria, sabe? E refletir que olhar para o próximo e pra sociedade não é algo “exemplar”. É o que todos deveríamos fazer enquanto sociedade. Pensar o que nos faz feliz muito além de bens, aparências, status. O que realmente importa para cada um e que legado deixamos aqui. Eu tenho muita noção do privilégio que tenho e tento compartilhar o meu da maneira que posso.
Às vezes me perguntam o que me motiva pra fazer X ou Y e o que ganho com isso. E a resposta é mais simples do que qualquer coisa “eu faço porque eu sou grato a tudo que já fizeram por mim”. Agora, pode ser que seja a sua vez de estender a mão.
Quem são as pessoas de qualidade que gostaria que participasse do Papo Possível?
Eu acho que a Amanda é uma pessoa legal e muito mais otimista do que eu.
Tem uma amiga minha que se chama Íris Fuzaro. Ela era estrategista e uma hora deu uma guinada na vida. Fez um projeto chamado Le Tour du Monde e depois várias outras coisas, como um projeto chamado “Uncensored Playlist” que ganhou Titanium em Cannes. Foi pra uma parte mais de arte/produção.
Enzo, que prazer ter tido esse papo contigo. Fico super contente que você disponibilizou parte do seu tempo precioso para compartilhar sua história. Saio daqui muito inspirado. Tamojunto!
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